O nicho invisível da Indústria da Moda

A moda inclusiva é uma proposta com foco na diversidade humana, mas ainda é muito pouco praticada no Brasil e em outros países.

Bruna Furlan
4 min readAug 13, 2020

Já faz algum tempo que o mercado da moda começou a quebrar barreiras e padrões. Conhecido por ser uma indústria que permite a expressão de si mesmo, esse mercado passou a mudar sua estética e a incluir diversos biotipos, etnias e culturas, permitindo que a moda alcance e sirva como forma de representação para mais pessoas. Entretanto, ainda há um longo caminho para ser percorrido quando se fala sobre a inclusão de pessoas com deficiência nesse mercado.

A inclusão social de pessoas com deficiência ainda é bastante complexa no Brasil. De acordo com uma pesquisa do IBGE, divulgada em 2012, cerca de 23,9% da população brasileira possui algum tipo de deficiência, constituindo de mais de 3 milhões de pessoa no Estado de São Paulo. Diante desse número, o mercado de moda inclusiva ainda segue a passos lentos, apesar da bandeira que a indústria vem levantando sobre sua democratização e a quebra de padrões de beleza.

A moda inclusiva é uma proposta com foco na diversidade humana. Um conceito cuja prioridade são aspectos como a mobilidade e a funcionalidade da roupa. A inserção desses aspectos por esse mercado facilita o cotidiano de pessoa com estas condições. E, diferente do que muitos pensam, não torna a peça exclusiva para ela. Grandes empresas evitam produzir peças inclusivas para o público com necessidades especiais pois não enxergam-o como um comprador, devido ao círculo de invisibilidade em que eles se incluem.

Para disseminar a necessidade de uma moda que abrace todos, a Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência criou um projeto que leva aulas gratuitas sobre Moda Inclusiva para cidades do Estado de São Paulo. O curso é dividido em dois módulos, um sendo sobre negócios e outro sendo sobre criação. Ambos visam refletir sobre a necessidade e promoção de produtos e serviços que levem em consideração as perspectivas e particularidades da pessoa com deficiência.

Produtos que sejam de fácil manuseio são essenciais para pessoas com deficiência, pois lhes trazem uma sensação de autonomia. Uma peça de roupa que se adapte às necessidade especiais e individuais não é exclusiva deste público, ou seja, por meio de estratégias econômicas não traria consequências negativas para as marcas. Um exemplo disso é um modelo de calça que se tornou tendência em 2018. Ele possui uma fenda nas laterais, com botões que podem ser abertos.

Esse produto é acessível para pessoas com deficiência pois os botões podem auxiliar uma pessoa com deficiência visual — que constituem 40% das pessoas com deficiência no Estado de SP — a identificar a melhor maneira de vestir o produto. Enquanto isso, a peça também torna-se confortável para uma pessoa com deficiência física — cerca de 28,8% das pessoas com deficiência –, que vive sua vida sentado em uma cadeira de rodas. Ao mesmo tempo, a calça se tornou um modelo desejado, por possuir uma versatilidade de estilos, sendo usado também por pessoas que não possuem deficiência. Esse fenômeno prova que a Moda Inclusiva não somente pode ser utilizada por todos, como também traz peças com maior diversidade e conforto, que se tornam populares.

De acordo com a gestora do programa de Moda Inclusiva, e mulher com deficiência, Isabelly Palma, 27, esse mercado ainda é muito escasso porque “falta informação, conhecimento e o mindset, de fato, inclusivo”. Palma também afirma que “o círculo da invisibilidade é uma das grandes razões desse mercado ainda ser escasso, ou seja, falta informação pro grande mercado”.

O círculo da invisibilidade pode ser definido como um círculo vicioso, onde as grandes empresas não enxergam pessoas com deficiência. Estas, por suz vez, também deixam de enxergar essas empresas como fornecedoras de produtos de consumo. “Quem não é visto, não é lembrado”, foi o ditado utilizado por Palma para tentar definir o círculo da invisibilidade. Quando as pessoas com deficiência não vistas pela sociedade, os negócios esquecem que elas são consumidores em potencial, portanto, não produzem peças adequadas às mesmas. Devido a esse fator, a pessoa com deficiência não possui motivo para frequentar essas empresas, fazendo com que ela seja ainda menos vista e recomeçando o círculo.

Essa falta de reconhecimento da pessoa com deficiência pela Indústria da Moda se torna muito problemática e prejudicial para as mesmas. Assim como pessoas que não possuem deficiência, pessoas com deficiência também precisam de roupas adequadas para cada tipo de ocasião, como uma ida à praia ou uma entrevista de emprego.

Quando surge uma ocasião que seja necessário comprar algum tipo de roupa específico, pessoas sem deficiência sabem em quais lojas ir para encontrar o que procuram. Entretanto, pessoas com deficiência não possuem essa escolha, pois dentro do mundo da Moda Inclusiva não há uma quantidade muito grande de nichos. “Eu sinto muita falta de poder ter escolhas próprias, e não simplesmente vestir o que é possível, no sentido que cabe em mim, que fique confortável. Eu não quero vestir algo porque é a única opção”, desabafa Palma.

O objetivo da moda inclusiva é que todas as áreas de vestimenta tenham as informações necessárias para conduzir a Moda Inclusiva. É necessário um trabalho de conscientização muito forte para que a Indústria da Moda passe a ter um pensamento inclusivo, para que então possam investir nessa área e colocá-la em prática. É necessário despertar o pensamento inclusivo nas pessoas que fazem a indústria existir, informando-os, ensinando na forma mais generosa possível, e mostrando para essas pessoas o que é a moda inclusiva e o que está relacionado a ela, mostrar que a pessoa com deficiência é um cliente em potencial.

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